Foto: Acervo Colégio Visconde de Porto Seguro
ARTIGO - A arte e a cultura na formação curricular: o caminho para o autoconhecimento e a cidadania = Por Lisie De Lucca
No cenário educacional contemporâneo, falar
sobre a importância da arte na formação dos alunos transcende o lazer e o
treino de habilidades nos cursos extras. O ensino de artes visuais, música,
teatro e dança constitui a educação estética, ou seja, a educação das
sensibilidades, das formas que temos de perceber a nós mesmos e o mundo em que
vivemos. Educar os sentidos nos coloca no caminho certo para extrairmos mais
prazer e significado das experiências, em qualquer fase da vida. Além disso, é
parte essencial de um processo formativo que visa não apenas à expansão
cultural como também ao desenvolvimento de indivíduos mais críticos, criativos
e empáticos. Para crianças e jovens, o contato com a arte é, ao mesmo tempo,
uma janela para dentro e para fora, ou seja, para o autoconhecimento e para a
diversidade do mundo, sendo assim um caminho para a cidadania global.
Diversas pesquisas reforçam esse ponto. Um levantamento do Instituto Alana,
realizado em 2019, revelou que 80% dos educadores acreditam que o ensino de
artes impacta positivamente o desenvolvimento cognitivo e emocional dos alunos.
Ao explorar a expressão artística, as crianças aprendem a lidar melhor com as
próprias emoções, desenvolvem a habilidade de trabalhar em grupo e são
estimuladas a pensar de maneira criativa para solucionar problemas. Pesquisas
como a conduzida pelo educador estadunidense James S. Catterall indicam que,
por seu caráter interdisciplinar, a arte é a área que mais promove o que ele
denominou “transferência cognitiva”, ou seja, é a que aprimora habilidades
cognitivas de forma mais abrangente, auxiliando no desenvolvimento de outras
áreas do conhecimento.
Vemos isso diariamente, na prática. Estudantes que participam de atividades
relacionadas à música e às artes plásticas demonstram maior capacidade de
concentração e enfrentam desafios com mais confiança, porque toleram melhor a
ambiguidade, a surpresa e o improviso, mobilizando sempre seus próprios
recursos e autoconhecimento para trazer soluções para suas criações. Estudos
realizados pela Universidade Harvard em 2020 e pela Cultural Learning Alliance
UK em 2024 mostram que crianças envolvidas regularmente em atividades
artísticas apresentaram melhorias significativas na autoestima e no bem-estar
emocional, bem como apresentam 38% mais probabilidade de relatar boa saúde.
A arte, no entanto, não se limita a favorecer o indivíduo. Ela desempenha um
papel crucial na formação de cidadãos conscientes e engajados, que respeitam a
diversidade e diferentes perspectivas. Ao trabalhar múltiplas manifestações
culturais, os alunos entram em contato com realidades diversas, desenvolvendo
empatia e respeito pelas diferenças. Esses valores são essenciais para a
convivência em uma sociedade plural e complexa como a nossa. Não é à toa que,
no Reino Unido, a pesquisa “Creative Partnerships” (2018) mostrou que jovens
envolvidos em programas culturais demonstraram mais habilidades de liderança e
engajamento social ao longo da vida.
É fundamental que as escolas busquem integrar a arte e a cultura de forma
orgânica à rotina dos alunos, refletindo não apenas seus talentos como também
seu amadurecimento emocional e social. Esses momentos revelam como a educação
artística pode transformar a maneira como os jovens veem o mundo e se
posicionam nele.
Portanto, defender o espaço da arte e da cultura no currículo escolar é, antes
de tudo, reafirmar o compromisso com uma educação que vai além das notas.
Trata-se de buscar a realização pessoal dos estudantes e acreditar que, ao
formar alunos mais conscientes de si mesmos e do mundo à sua volta, estamos
contribuindo para a construção de uma sociedade mais justa, inclusiva e humana.
Lisie De Lucca é Mestre em Educação, artista visual e diretora de Cultura do Colégio Visconde de Porto Seguro