
Foto: Divulgação
ARTIGO - IVA no Brasil: desafios, impactos e a reforma tributária = Por Eduardo Berbigier
O IVA (ou Imposto sobre Valor
Agregado) que é a unificação de diversos impostos, recentemente aprovado na
reforma tributária, nos traz algumas reflexões sobre os desafios para a sua
implementação.
O IVA permite mais transparência e facilidade de
tributação, por isso é utilizado por mais de 170 países, dos 193 reconhecidos
pela ONU, segundo dados da Tax Foundation de 2022. À exceção dos Estados
Unidos, onde cada estado tem o seu regime próprio de vendas e não há imposto
federal de consumo, o IVA é consenso entre economias desenvolvidas e em
desenvolvimento.
Trata-se de um imposto de caráter geral e indireto
sobre consumo, que pretende tributar toda a cadeia econômica de produção e
distribuição de bens e serviços, e que permite, a cada etapa, a dedução do
imposto pago. Ao final, o imposto também deve incidir sobre o
"destino", onde se verifica o consumo, recaindo sobre o consumidor
final de bens e serviços.
No Brasil, o valor exato do imposto será conhecido ao
final da implementação da reforma tributária, que será feita em etapas entre os
anos de 2026 e 2033. A regulamentação sancionada por Lula, no entanto, institui
uma trava no aumento do IVA, com teto de 26,5% para a alíquota-padrão. Em 2031, uma avaliação estimará se as
alíquotas finais do IVA, que entrarão em vigor em 2033, serão maiores que vinte
e seis e meio por cento (26,5% ).
O que desperta a atenção nesse imposto é que, com a
recente sanção presidencial do Projeto de Lei Complementar (PLC) 68/2024, que
regulamenta os tributos sobre o consumo, muitos políticos e economistas,
defensores da tributação, estão tentando criar um sentimento de nacionalidade
em torno do tema. No entanto, vale um alerta: é necessário questionarmos tantas
certezas estabelecidas e propagadas.
Importante destacar que a referida reforma em curso
já incluiu emenda constitucional, lei complementar e mudanças que alteram os
interesses dos 26 estados brasileiros e do Distrito Federal. A meu ver, as
votações foram pouco discutidas e precipitadas, diante de um tema tão complexo.
Os defensores do imposto alegam que o assunto foi
debatido durante quarenta anos e que os atuais resultados envolveram amplos
setores da sociedade. Não estou seguro disso.
Sabemos que, no cenário atual brasileiro, o que
prevalece como lei é a vontade do grupo de pressão mais forte.
Voltando a refletir sobre o tema, importante lembrar
que, afirmam ainda, os defensores da reforma tributária e do IVA, que a partir
de agora vamos nos desligar do pior sistema tributário do mundo, que penaliza
os pobres, e entrar em uma nova era, com um sistema incomparavelmente mais
moderno, que contará com mecanismos para combater as desigualdades sociais.
Anunciam que famílias inteiras e, especialmente, as nossas criancinhas,
melhorarão de vida; que a economia será fortalecida, haverá aumento da
produtividade, geração de empregos e uma distribuição de renda mais justa.
Viveremos no melhor dos mundos. Será? Vamos aos fatos concretos.
No Brasil, tributamos mais o consumo do que a renda.
Estamos cientes de que o imposto sobre consumo é injusto. E por quê?
Porque atinge todo mundo que compra. Se uma pessoa
tem uma renda de cinco mil reais e comprar um determinado objeto, ela paga
imposto. Se outra pessoa, com renda de 100 mil reais, comprar o mesmo objeto,
paga exatamente o mesmo imposto. Por isso, é injusto. Mas, tudo indica que,
mesmo com a reforma tributária, continuaremos cobrando imposto sobre o consumo.
Desde já, temos conhecimento de que, quando chegarmos
ao final da reforma, em 2033, poderemos ter o Imposto de Valor Agregado (IVA)
mais elevado do mundo: 28,5%.
Visitei, recentemente, alguns países da Europa. Ao
pesquisar sobre o tema verifiquei que o IVA da Eslováquia, por exemplo, subiu
para 23%, no dia 1º de janeiro de 2025 (era 20%); o IVA da Hungria é de 27% (o
maior do mundo atualmente); o IVA da República Tcheca é 21%; o da Áustria, 20%.
Os outros IVAs mais altos que encontrei são dos
países nórdicos (Noruega, Dinamarca, Finlândia), em torno de 25% a 26%.
Contudo, são países com uma economia fortíssima,
população pequena e serviços de excelente qualidade prestados à população. Por
isso, há, de certo modo, uma justificativa para a tributação mais alta.
Portanto, é certo que, realmente, o Brasil vai se
destacar negativamente com relação à carga tributária no tocante ao IVA.
O que nos leva a pensar dessa forma? Fatos concretos.
Vejamos apenas alguns, dos inúmeros desafios para a implementação do IVA no
Brasil:
1. Complexidade do sistema atual: o Brasil possui um
sistema tributário fragmentado, com impostos sobre consumo em diferentes níveis
(federal, estadual e municipal), como ICMS, ISS, PIS e COFINS. Cada estado tem
regras próprias para o ICMS.
2. Conflitos federativos: a arrecadação de impostos
sobre o consumo é vital para estados e municípios, que temem perder autonomia
fiscal com a centralização do IVA. O IVA exige a redistribuição da arrecadação
entre entes federativos, o que pode gerar disputas políticas.
3. Dimensão e desigualdades regionais: regiões mais
desenvolvidas (Sudeste e Sul) geram mais consumo e, portanto, mais arrecadação.
Estados menos desenvolvidos (Norte e Nordeste) temem perder receitas com a
mudança na base tributária.
4. Transição complexa: implementar o IVA requer
substituir ou integrar vários impostos existentes, o que pode gerar incertezas
para empresas e governos. A adaptação tecnológica necessária para empresas e
entes arrecadadores é desafiadora, especialmente para micro e pequenas
empresas.
5. Carga tributária elevada: o Brasil já possui uma
das mais altas cargas tributárias do mundo, e um IVA mal calibrado pode
aumentar os custos para consumidores e empresas, prejudicando o crescimento
econômico.
Portanto, ao final dessa reflexão concluímos que,
está claro que a implementação do IVA em nosso país, depende de reformas
estruturais amplas, muito bem coordenadas e profundamente debatidas com a
sociedade. Os desafios políticos, econômicos e técnicos são enormes. E, para a
tristeza dos brasileiros, a partir 2033, teremos o maior imposto sobre valor
agregado ou adicionado do mundo. É questão de lógica. O tempo confirmará.
Eduardo Berbigier é advogado tributarista, especialista em Agronegócio, membro dos Comitês Juridico e Tributário da Sociedade Rural Brasileira e CEO do Berbigier Sociedade de Advogados