Foto: Divulgação/Arquivo O Candeeiro
artigo - Hospitalidade = Por André Naves
Nem lembro do
ano. Acho que era no tempo em que a Romênia era ainda Rumânia...Será? Eu
sempre tive minhas excentricidades, sabe? Um espírito contestador e
vaidoso. É da minha natureza deixar todo mundo meio embasbacado com
curiosidades sem eira nem
beira. Imagina uma criança, que nem bem saiu da casca do ovo, falando
que Baku é a capital da República Soviética do Azerbaijão, ou que Astana
era a capital do Cazaquistão. Eu nem sabia direito o que era a União
Soviética, mas o meu prazer estava
em encher a boca e falar.
Fim de ano, eu ia direto ler as historinhas do “Almanacão de Férias”, da Turma da Mônica, e pescar essas curiosidades totalmente aleatórias no Almanaque Abril. Iugoslávia, Tchecoslováquia, Cortina de Ferro…Qual a produção de trigo da União Soviética? E a dos Estados Unidos? Naquele tempo, a gente ainda importava até nosso feijão com arroz. Foi lá, naquele Almanaque Abril de um passado longínquo (mas nem tanto, né?) que vi, num quadrinho meio escondido, uma curiosidade que mudou a maneira como eu enxergava tudo. Acho que ninguém vai acreditar, mas parece que o bolo de fubá é uma invenção judaica.
Que coisa, né?
Tem cara, jeitão e gosto de Minas. Será que a cidade de Monte Sião,
então, é em homenagem ao mais orgulhosamente caipira dos bolos? Ao que
parece, quando cruzaram os mares os primeiros judeus, fugidos das
fogueiras intolerantes, e
chegaram para desbravar essa nova terra, não encontraram farinha de
trigo. Sabem como é, né? Só não se vira caju quem já nasceu virado…Foram
cozinhar com o que tinham. Os índios conheciam muito o milho. Daí para o
bolo foi um pulinho. Se a gente
pensar que o café veio da Etiópia, então, a gente faz um belo
samba-enredo! Essa curiosidade foi igual um chiclete na minha cabeça.
Vocês já ouviram a Marcha Turca de Mozart? Ai Se Eu Te Pego, do Michel Teló? Descer pra BC, do Brenno e Matheus? É desse tipo de coisa que não sai das ideias… Eu estou aqui escrevendo essa crônica e “pá!”, de repente eu começo a imaginar os ETs coloridos dançando... Igualzinho as origens do bolo de fubá! Acho que se eu pudesse escolher uma refeição, qualquer uma, seria bolo de fubá e café!
Mas toda vez minha imaginação viaja na maionese e eu fico só pensando em como foi quando Abraão, tranquilo, no alpendre, meditando sobre a vida, enxergou os três anjos. De lá ele já deu um grito: “Sara, vida! Põe essa mesa que chegô visita! Passa um cafezim e tira aquele seu bolo especial do forno! Senta aqui, gente! Prova um pedacim desse bolim que a Sara acabou de assá! Ocês vão gostá demais da conta!”
E daí, eles iam trocar um tostãozinho
de prosa! As boas novas seriam compartilhadas, e o maior riso chegaria!
E lá pelas tantas, quando Abraão descobrisse os planos do Criador para
Sodoma e Gomorra, ele ia intervir. Tentar convencer Deus.
Será que não tem um justo perdido no meio de toda aquela gente?
Prefiro imaginá-lo como um ativista de Direitos Humanos. Gente da gente!
Tomando cafezinho com pedacinho de bolo. De fubá, claro!
*André Naves é Defensor Público Federal, especialista em Direitos Humanos e Inclusão Social; mestre em Economia Política; autor do livro “Caminho – A Beleza é Enxergar”.