Zulu Araújo é referência na luta contra o racismo / Foto: Pedro Salles
Com mais de 50 anos de ativismo no movimento negro, Zulu Araújo aborda enfrentamentos e conquistas em seu primeiro livro
No dia 3 de dezembro (quarta-feira), às 18h, Zulu Araújo lança o livro ‘Apenas um cidadão’, no Museu Nacional da Cultura Afro-Brasileira (Muncab), no Centro Histórico. Editada pela Solisluna, a obra marca a estreia do ex-presidente da Fundação Cultural Palmares no universo literário. O evento é aberto ao público.
Embora não seja um livro de memórias, o leitor vai encontrar fragmentos de memórias guardados ao longo de mais de 60 anos de histórias que, quando contadas, despertavam encantamento nos interlocutores. “Esse livro foi incentivado por alguns amigos que ouviam minhas histórias e viam nelas potencial para uma publicação. Nele, o leitor encontrará versões de histórias divertidas pelas quais passei, momentos familiares e os altos e baixos que todo baiano passa. Em particular no tocante à resiliência do racismo em nossa sociedade, e reflexões sobre momentos importantes da minha vida política e cultural”, destaca ele.
Zulu começou a trabalhar aos 10 anos de idade para ajudar no sustento da família pobre. Aos 18, já fazia parte do movimento negro. Em 1973, entrou para o Partido Comunista Brasileiro (PCB), o Partidão, como era conhecido. “Foi uma verdadeira escola política e de vida”, garante. Nesse período, o Brasil enfrentava uma ditadura e exercer a cidadania em sua plenitude, principalmente para o povo negro, podia custar caro.
Aos 73 anos, depois de muitas lutas e algumas conquistas, será que ele pode, finalmente, se considerar um cidadão? “Claro que os tempos são outros e muita coisa mudou positivamente, se compararmos com o período ditatorial, mas ainda existem fortes entraves para o exercício pleno da cidadania, ainda mais se você for uma pessoa preta no Brasil. Exemplo são as abordagens policiais nos bairros pobres do nosso país, onde meter o pé na porta substitui a autorização judicial e a bala substitui o devido processo legal. Lamentavelmente, ainda se faz presente no imaginário da população que ‘branco correndo é atleta, e preto correndo é ladrão’. E aí não há cidadania que resista”, analisa.
Mas Zulu acreditou no poder transformador da educação, fé que herdou do pai, seu Eutímio Mendes Araújo. No capítulo ‘Aprender a ler para ensinar aos camaradas’, ele fala da vida estudantil, da entrada no mundo da cultura por meio das mostras de som da Escola de Arquitetura da UFBA, que cursou, e do gosto pela palavra escrita e falada. A partir da educação, veio a consciência cidadã, necessária para o enfrentamento ao racismo: “Em primeiro lugar, é preciso ter muita firmeza e consciência dos nossos direitos. Em segundo lugar, tem que criar e manter uma rede de solidariedade a esse direito, particularmente junto a organizações do movimento negro e dos direitos humanos. E, por fim, tem que ter coragem para os enfrentamentos necessários”, afirma.
Referência e homenagens
Natural de Salvador, Zulu Araújo virou referência nacional na luta antirracista. Formado em arquitetura, mestre em Cultura e Sociedade e doutor em Relações Internacionais pela UFBA, ele tem vasta experiência em produção e gestão cultural. E não foram poucos os cargos que ocupou ao longo da vida profissional: diretor-geral da Fundação Pedro Calmon (entre 2015 e 2023); diretor e conselheiro do Grupo Cultural Olodum, período em que acompanhou o nascimento do Bando de Teatro Olodum; em 2003, assumiu a direção de Promoção, Intercâmbio e Divulgação de Cultura Afro-brasileira da Fundação Palmares; e, em 2007, foi indicado pelo então ministro da Cultura, Gilberto Gil, para presidir a instituição, cargo que ocupou até 2011.
Em ‘Apenas um cidadão’, Zulu narra os enfrentamentos, mas também celebra as conquistas. Nos últimos capítulos, ele destaca as homenagens que recebeu ao longo da sua trajetória. “Homenagens que me dão muito orgulho”, conta. A mais recente, no entanto, não teve como entrar na publicação. Na última quinta-feira, 20 de Novembro, Dia da Consciência Negra, Zulu foi homenageado, junto a outras personalidades, no Parque Memorial Quilombo dos Palmares, localizado na Serra da Barriga, em União dos Palmares, Alagoas, por ser uma das lideranças negras que moldaram a história do Brasil.
Primeiro e único parque temático sobre a cultura negra do país, o Parque Memorial Quilombo dos Palmares foi implantado em 2007, quando ele era o presidente da Fundação Cultural Palmares. O lugar recria o ambiente da República dos Palmares, o maior, mais duradouro e mais organizado quilombo já implantado nas Américas. A homenagem marcou, ainda, os 330 anos do Quilombo dos Palmares.
Mesmo já contando mais de sete décadas de vida, mais de 50 anos de militância, tendo acumulado histórias, cargos, títulos, homenagens e contribuído para a evolução da sociedade, Zulu Araújo não pretende parar por aqui. Como ele próprio diz: “Toca a zabumba que a terra é nossa!”
Sobre a Editora
A Solisluna Editora desde 1993, realiza projetos e ações que sensibilizam e levam à reflexão sobre diferentes realidades e modos de ver o mundo; edita e publica livros que celebram a cultura, a natureza, o imaginário e a diversidade. Ao longo de sua história, tem construído pontes entre arte, palavra e afeto, valorizando autores, ilustradores e temas que dialogam com a Bahia, o Brasil e o mundo.
SERVIÇO
Lançamento do livro Apenas um Cidadão de Zulu Araújo
Bate papo com Zulu Araújo e Paulo Miguez
Mediadora: Mirtes Santa Rosa
Data: 3 de dezembro de 2025
Horário: 18 horas
Local: Muncab Endereço: R. das Vassouras, 25 - Centro Histórico
Entrada gratuita
O LIVRO
Apenas um Cidadão
Autor Zulu Araújo
15.5 x 23.0 cm
208 páginas
Capa brochura
Preço no lançamento: R$ 80,00
Por Nilma Gonçalves
